Despertou lentamente, ao toque suave da brisa de
um novo dia. A luz entrava em um espectro de cores pela janela, como nunca
antes tinha visto. Sua visão estava diferente. Todo o recinto cheirava a
lavanda, seu perfume preferido.
Decidiu afastar os lençóis com suavidade, porém
firmemente. Não tinha desejos de ficar, nem de partir. Mas algo chamava para
fora. Algo no ar lhe soprava desígnios de um futuro que se abria. De um lugar
fora do espaço, de alguma data fora do tempo...
Levantou-se. Pisou o chão. Já não parecia haver
limites. Não sentia dor como antes. Nem frio. Nem fome. Em algum momento a
prisão se abrira como num suspiro... talvez o último. A última prisão...
Ainda que seus pensamentos não conhecessem
limitações naquele momento, algo ainda seguia sua ordem. Cada estrela, cada
cometa, cada partícula ainda pulsava dentro de si. Como se fizesse parte de
tudo... como se pudesse ver sem realmente ver, ouvir sem realmente ouvir.
Caminhou para fora do quarto. Seus passos pareciam tão leves, como plumas
seguindo ao sabor da brisa travessa que cismava em remexer com as folhas
no jardim. Era ela a mensageira da vontade de sair, seguir... pairar. Por sobre
o chão... e sobre o passado.
Já não era a mesma hora... 53 minutos. A última frase que se lembrava de ter ouvido. Ou o que ouviria em seguida... Mas
já não importava saber ao certo. Ainda pairava sobre o chão de madeira, ainda
seguia ao sabor da brisa sem saber onde daria...
Do lado de fora, no jardim, alguém parecia esperá-la
há muito tempo... 53 minutos não seriam suficientes. Queria fazer perguntas,
rever todos os olhares, abraçar novamente cada um dos que vira, beijar cada um
dos que tocara, ouvir cada um dos que também seguiram.
- Ainda tenho tempo?
A figura não respondeu. Apenas olhava o
horizonte e sorria levemente. Parecia hipnotizada com o baile de folhas que
remexiam ao sabor da brisa. Não percebia nenhuma outra presença. Sentia, mas
não ouvia.
- Será que vamos nos ver de novo?...
A pergunta, agora, ecoou como a fala nas
montanhas. Talvez sua voz fosse afônica para a audição do mundo comum. Virou-se
na direção que tinha que seguir para finalmente partir e não olhar para trás.
Mas a figura se mexeu. Olhou em volta... não em
seus olhos. Chorava, mas sorria.
- Foram apenas 53 minutos... mas não vou me
esquecer de nada. – disse, sorrindo.
Sem pensar duas vezes, pairou sobre a grama
verde. Seguiu ao sabor da brisa... e não olhou mais para trás.
Sabia que não esqueceria.
Deu seu último suspiro e partiu, deixando para
trás sua última prisão...
Para ser livre pela eternidade.
Cada vez melhor, Capuccina!
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