Cidade,
cidadania, cidadão, todas são palavras com a mesma raiz etimológica, diz
Aurélio. Mas concordemos que nem sempre felicidade está na raiz de se viver em
aglomerados urbanos, mesmo que a sonoridade na rima pouco criativa ainda lhe
caia bem.
Os
seres humanos, desde sua evolução para seres altamente sociais, buscam o
conjunto e a conjunção de forças e habilidades para segurança, proteção, aconchego.
As cidades – e, em consequência, as grandes cidades – criaram-se dessa
necessidade de união, sendo o Estado criado para garantir a qualidade mínima de
vida de cada cidadão sob seu domínio.
Tudo
muito lindo na teoria dos livros de História e para Aurélio, talvez. Mas, na
prática da vida de cada pessoa que (sobre)vive nas cidades, não é bem assim.
Cidades feitas para proteger, servir e aconchegar hoje oprimem. O que antes era
pensado para permitir e facilitar o acesso de pessoas agora não passa de um
aglomerado desenfreado de concreto vazio, de obras de arte arquitetônicas maravilhosas...
Mas para quem mesmo?
Sou
metade paulistana, metade brasiliense. Vivi numa São Paulo de paralelepípedos,
pipas no céu, joelhos ralados e um bom punhado de carros. Já não havia muito
verde nem planejamento urbano, mas era possível ir até um parque de bicicleta.
Hoje em dia cada paulistano anda em seu carro na mesma velocidade do que nós em
bicicletas: 14km/h - duas horas e meia todos os dias dentro de um carro, em
média. E nem adianta reclamar do motorista da frente, o problema está na
quantidade de veículos nas ruas (e cada um talvez com apenas o motorista dentro
dele). Pouco ou nada é feito para mudar a situação. Talvez um túnel ou viaduto aqui
e ali, onde ainda tiver terra ou céu para “enfeitar”. Paliativos eleitoreiros,
nada mais. Soluções não vêm dos céus ou da terra, tão pouco das urnas.
Brasília,
onde atualmente vivo e crio meu filho, segue rumo ao mesmo destino, com exceção
de que, se tivermos um dia o mesmo tanto de gente do que São Paulo, estaremos
vivendo “cada um no seu quadrado”, literalmente. Temos apenas duas grandes
saídas da cidade, Norte e Sul. Pensando que todos (cada um no seu volante) vão
e voltam no mesmo horário, e que o Plano Piloto absorve a maior massa de
trabalhadores, em poucos anos teremos de morar dentro de nossos veículos.
Penso
que Brasília, lindamente idealizada e construída por algumas personalidades “faraônicas”
- megalomania é mera coincidência - teve em seu processo de criação um
pensamento humanista e utópico como a nossa Constituição de 88.
Maravilhosamente altruístas, belas, buscando o bem como princípio, a igualdade
como fundamento, mas enfaixadas e imóveis feito uma múmia, igualmente inacessíveis.
Lindas na teoria, mas carregando em si o medo da mudança pelo processo dispendioso
para alterá-las, tanto Constituição quanto cidade. Brasília é tombada e leva
tombos em sua função de servir e amparar pessoas. Nada pode mudar, e para mudar
é preciso muito tempo, muito pensar, sendo montada feito um “Frankestein”
arquitetônico. Semelhante à nossa amiga Constituição, uma verdadeira colcha de
retalhos...
O
que fazer para mudar a situação? Talvez olhar para a realidade ao invés de
ficar olhando para um ideal, construir ouvidos nas paredes de concreto para
escutar o que sua população deseja, sente, pensa. Quem sabe assim teremos
cidades, efetivamente, com a mesma raiz de cidadão e cidadania, e onde possamos
fincar as raízes de nossa feli(z)cidade. Aurélio que o diga...
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